Inflação na Ásia eleva preço do arroz ao produtor gaúcho
O esforço de países asiáticos em conter a inflação em seus territórios vem impactando nos preços do arroz produzido no Rio Grande do Sul. Ao restringir a exportação do grão para evitar elevação dos preços internos, a Índia, responsável por 40% do cereal distribuído para o mundo, acabou gerando um efeito de alta na cotação em diferentes pontos do Estado.
O cenário entusiasma arrozeiros, mas não ao ponto de provocar euforia. Cautelosos, eles procuram aproveitar o momento, mas não acreditam em manutenção na tendência de alta. Se a saca de 50 quilos de arroz localizado na região litorânea do Rio Grande do Sul já é negociada a R$ 100,00, em Capivari do Sul, por exemplo, e com valor médio no Estado de R$ 93,00 nos últimos dias, o setor sabe que a entrada da safra norte-americana no mercado global, a partir de setembro e outubro, deve reposicionar os valores em um patamar abaixo do atual.
Conforme o consultor da Safras & Mercado e especialista no mercado de arroz Evandro da Silva Oliveira, na Fronteira Oeste os preços têm ficado em uma média que oscila entre R$ 88,00 e R$ 90,00 a saca. Na Região Central, a cotação gira entre R$ 85,00 e R$ 87,00. E, até o início do próximo ano, a média gaúcha pode mesmo alcançar os R$ 100,00.
“Nesse momento, quem está capitalizado e não tem dívidas, segura o grão, esperando por uma valorização ainda maior. Ainda é cedo para projetar negócios a R$ 120,00 a saca, como alguns cogitam, mas há margem até janeiro de 2024. Entretanto, via de regra, quem está negociando acima dos R$ 90,00 já está fazendo um bom negócio, uma vez que o custo de produção dos grãos estocados hoje foi muito elevado, por conta dos preços dos insumos, afetados pela especulação em torno da guerra na Ucrânia e outros fatores”, analisa Oliveira.
Essa turbulência no contexto mundial da cultura preocupa países dependentes da importação e gera expectativas exacerbadas, observa o especialista. Mas, para ele, o momento atual é o melhor em muito tempo na relação de troca entre os preços do arroz e de fertilizantes. E deveria ser aproveitado pelos produtores.
“O custo dos insumos diminuiu bastante para a safra 2023/2024 em relação às últimas. O dólar também baixou. E temos uma boa expectativa sobre as exportações, com os estoques mais apertados e preços firmes. Na temporada passada, os embarques já foram recorde, superando as 2 milhões de toneladas entre fevereiro de 2022 e março de 2023. E, neste ano, de janeiro a julho, exportamos mais de 1 milhão de toneladas, quase 18% acima do mesmo período de 2022. Existe um superávit de, aproximadamente, 160 mil toneladas na balança internacional do arroz no Brasil”.
O risco, porém, é mesmo a concorrência dos Estados Unidos. Atualmente, os preços do arroz americano estão mais atrativos em até 8%. E a safra plantada lá foi de mais de 1 milhão de hectares, com produção de 9 milhões de toneladas Esses grãos, colocados à venda, podem roubar mercados do Brasil.
O contexto pode interferir nas lavouras gaúchas na próxima semeadura. Levantamento de intenção de plantio feito pela Safras, levando em consideração a perspectiva de El Niño, os preços para as culturas de arroz, soja e milho e os custos de produção, apontam para a possibilidade de o Rio Grande do Sul semear até 900 mil hectares, contra 839 mil na safra passada.
“São os primeiros sentimentos que estamos apurando junto a produtores, clientes e cooperativas. As chuvas abundantes são benéficas para a cultura, mas a menor incidência solar compromete a produtividade. A tendência é de o produtor compensar com um leve avanço no tamanho da área plantada”, diz Evandro Oliveira.
A projeção contrasta com as percepções do Instituto Rio Grandense do Arroz (Irga) e da Federação das Associações de Arrozeiros do Rio Grande do Sul (Federarroz). Enquanto o Irga acredita em um aumento de área de até 12%, a Federarroz não aposta em uma alta superior a 5%. Paralelamente, a autarquia crê que a próxima safra seja até 40% mais barata, por conta da queda dos preços dos fertilizantes. Já a entidade representativa dos produtores é bem mais econômica e fala em redução entre 10% e 15% nos custos.
Setor sonha com cotações atuais para a comercialização da próxima safra
O que todos concordam é que o preço adequado ao produtor deveria mesmo girar na faixa dos R$ 100,00 a saca. É nesse patamar, aliás, que o diretor comercial do Instituto Rio Grandense do Arroz (Irga), Ailton Machado, acredita que os negócios irão se estabilizar. Para ele, o menor volume de estoques de passagem de arroz em uma década será um componente importante na cotação do cereal no mercado.
Segundo ele, alguns países, como Portugal, Uruguai e Argentina, por exemplo, já estão comprometidos com contratos de venda para nações africanas, reduzindo ainda mais o produto à venda. E há, ainda, a possibilidade de uma comitiva árabe desembarcar no Rio Grande do Sul para negociar a compra de arroz gaúcho, revela.
Para o presidente da Federação das Associações de Arrozeiros do Rio Grande do Sul (Federarroz), Alexandre Velho, a forte elevação do preço do óleo diesel nos últimos dias irá impactar diretamente a atividade nas lavouras. E o tamanho da próxima safra depende muito de um volume de chuvas suficiente – o que ainda não ocorreu – para encher as barragens nos municípios da Fronteira Oeste, que concentra 30% da produção arrozeira do Estado.
“Estamos em um momento de ligeiro aumento nas cotações do arroz, com alta nas exportações e sem concorrência até setembro. A índia, pelo seu peso no mercado, tem papel importante na formação de preços internacionais, e tudo que acontece lá gera reflexos no mundo. Mas essa é uma situação pontual. A safra passada foi muito cara. Somente há pouco tempo conseguimos vender a preços que compensassem os custos de produção. Os valores atuais são razoáveis, ou bons, quando projetamos a próxima safra. Mas não são valores consolidados.”
Alexandre Velho acredita que os preços menos atrativos da soja e o clima desfavorável à cultura devam frear a expansão nas áreas de várzea. Mas vê a rotação de culturas como solução para a atividade orizícola. “A soja consorciada com o arroz nos dá maior fertilidade e produtividade, além de contribuir muito para enfrentar os altos custos da produção de arroz”, finaliza.
Fonte: Jornal do Comércio