
Entidades criticam corte na alíquota de importação de alimentos
A decisão do governo federal de zerar alíquotas de importação de alguns produtos alimentícios (confira abaixo a lista) repercutiu mal entre produtores rurais, representantes da indústria de carnes e supermercadistas. A avaliação geral é de que a medida, além de inóqua, prejudica a competitividade do agronegócio nacional.
Na quinta-feira, o vice-presidente da República, Geraldo Alckmin, anunciou o corte nas tarifas para produtos como carnes, milho, açúcar, azeite de oliva, café, massas alimentícias, biscoitos, óleo de girassol e sardinha. O objetivo seria reduzir os preços dos alimentos ao consumidor final. Mas a melhor saída, apontam líderes do setor, seria incentivar a produção nacional, com menor tributação sobre insumos agrícolas, óleo diesel, energia elétrica e infraestrutura, por exemplo. O fim das alíquotas de importação sobre esses produtos ainda precisa ser aprovado pela Câmara de Comércio Exterior (Camex).
“Não vai dar em nada. O ex-presidente Bolsonaro fez algo muito semelhante em 2022, que também não funcionou. Com esse movimento, o governo investe no produtor dos outros países, que já recebem subsídios internos, e não no nosso”, diz o presidente da Federação dos Trabalhadores na Agricultura no Rio Grande do Sul (Fetag-RS), Carlos Joel da Silva.
Segundo ele, o governo deveria reduzir o custo de produção no Brasil, para dar mais rentabilidade e competitividade ao produtor local, abrindo mão, por exemplo, de impostos sobre a importação de insumos.
“Mas, ao contrário, retira imposto sobre o produto final que ingressa no País. Está criando uma concorrência desleal contra o Brasil. Uma decisão política, que desagrega cadeias e traz resultados ruins”, completa.
Para o presidente da Federação das Cooperativas Agropecuárias do Estado (Fecoagro/RS), Paulo Pires, a causa da inflação dos alimentos não está no preço dos produtos em si, mas nos custos de mão de obra, de energia, na alta carga tributária praticada no Brasil, o que atinge a capacidade de fornecer produtos a preços menores sem comprometer a viabilidade financeira do negócio.
“Deveríamos reduzir ICMS, PIS, Cofins, incentivar quem emprega. Mas optamos pelo caminho contrário. Quanto subiu o custo da energia? Por que não enfrentamos a questão da infraestrutura defasada e insuficiente, para reduzir os custos de produção? Por que não oferecer juros mais baixos para estimular a produção?”, questiona.
Pires lembra que o milho, um dos itens que tiveram alíquota de importação zerada, é um problema persistente no Estado, que produz menos de 60% do que consome. Mas, ainda assim, 600 mil toneladas anuais são negociadas no exterior. Isso porque os preços no mercado externo são melhores ao produtor, que precisa manter a atividade rentável. Enquanto isso, o RS importa o produto, fundamental na suplementação animal, de outros estados brasileiros.
“Sou um defensor da competição e de um mercado aberto. Mas custo a crer na importação de produtos sem subsídio mais baratos que os nossos. O produtor brasileiro não recebe subsídio. E, por outro lado precisa buscar financiamentos a taxas de juros anuais elevados. Mas o governo tem uma visão, a qual respeito, porém não concordo”, acrescenta o líder cooperativista.
Embora sem ter ainda tido acesso à íntegra do anúncio, o presidente do Sindicato da Indústria de Cernes e Derivados no Estado do RS (Sicadergs), Ladislau Böes, avalia que a medida não interferirá em nada sobre os preços finais.
“Esses produtos não estão caros apenas no Brasil, mas em outros países também. O preço do boi no Uruguai, no Paraguai e na Argentina, por exemplo, está mais alto que no Brasil. Então, dificilmente haveria como esses produtos chegarem aqui mais acessíveis ao consumidor. Inicialmente, nos parece que a medida é mais política do que econômica”, pontua o dirigente.
Na avaliação da Associação Gaúcha de Supermercadistas (Agas), qualquer eventual queda de preços deverá levar pelo menos 90 dias para ser percebida, uma vez que se trata de produtos importados. Mas, ainda assim, a medida deve ser pouco efetiva, já que tratam-se de commodities, como carnes e açúcar, com cotações em dólar, o que dificilmente chegaria de fora a preços menores.
“Alguns segmentos do agronegócio brasileiro podem se sentir prejudicados pelo anúncio, uma vez que a maioria dos itens é produzida internamente. Talvez haja resultados pontuais, como em relação ao azeite de oliva, cuja maioria da oferta é importada. Mas camadas de menor poder aquisitivo da sociedade não seriam beneficiadas”, projeta o gerente executivo da entidade, Francisco Schmidt.
OS ITENS COM ALÍQUOTA ZERADA:
• Carne: com tarifa hoje de 10,8%
• Café: atualmente em 9%
• Açúcar: 14%
• Milho: 7,2%
• Oleo de girassol: 9%
• Azeite de oliva: 9%
• Sardinha: 32%
• Biscoitos: 16,2%
• Massas alimentícias
Fonte: Jornal do Comércio