Beleza Absoluta

Por: Fábio Verardi

O Zaffari é o melhor lugar pra se fazer compras, tudo está sempre limpo, piso cheiroso, pela manhã tem jazz e no começo da tarde bossa nova na playlist musical, as coisas sempre estão no lugar certo nos fazendo achar que em outros mercados estão erradas. Existe um padrão que facilita tudo, o instinto nos leva automaticamente aos produtos sem precisar bater cabeça, a padronização torna tudo mais fácil. O caixa flui que é uma beleza, diferentemente do Carrefour onde parece que o pessoal é treinado para demorar e corrigir erros com uma gerente de caixa patinadora. Água mineral e farinha para pizza vão no débito, o bipe sonoro que confirma o pagamento dá lugar a uma Deusa no corredor, ela vem absoluta com seus 25 anos, óculos de sol perfeitos no rosto, uma linda tatuagem que toma o braço esquerdo da blusa cavada que tem as costas tomadas por um longo e perfeito cabelo que vai até a cintura. A pele canela dialoga com uma calça de ginástica que exalta todo o capricho de um corpo que deve suar muito todos os dias para ser o que é. A moça do caixa abre os lábios e olha, o empacotador congela com um quilo de farinha nas mãos, a turma da praça de alimentação fica silenciosamente pasma, o carinha de bigode mosqueteiro faz uma boca de ovo e o vendedor de consórcio, que usa sapato sem meias, se perde no assunto da live para seus seguidores. Uma avalanche que segue seu curso com o queixo caído do segurança da entrada, o franzir de testa da vendedora da ótica e com a paralisia das gurias das semijoias.

A Deusa que pede passagem faz um efeito dominó nunca antes visto naquele corredor e o gol de placa se dá quando já na porta automática de saída um casal de velhinhos, bem velhinhos, para, olha e a senhorinha gira em 180 graus para seguir a beleza absoluta, num verdadeiro xeque-mate. No universo daquele corredor do Zaffari não há como se falar em relativização da beleza, pois ela foi absoluta, assim como muitas outras coisas da vida são – o amor de mãe (não tente confrontar essa máxima), a amizade dos parceiros de fé e a crença de que tudo pode dar certo. Quando alguém acredita em você, diz – “eu acredito que você tem plena capacidade de conseguir”, ninguém diz “relativa capacidade”, pois o relativo amorna, tira a fé e faz surgir um tanto faz. Um abraço de amigo é absoluto, a saudade de quem não se via há anos também, o beijo da avó na netinha que só conhecia por videochamada é absolutíssimo. Na velocidade em que a vida passa não vale a pena ficar se equilibrando no muro do relativo, nosso universo de crenças merece ser absoluto e recheado do que realmente importa para nós. Dizer que tudo é relativo é a maior fuga já inventada nos tempos modernos, faz lembrar a fala do personagem Magro do Bonfa quando perguntado se havia entendido a matéria, ele respondia – “eu não sei se eu não entendi”. Relativizar o que não precisa ser relativizado é o abrir mão de sentimentos que muitas vezes não se repetem e que talvez não possam jamais ser absolutamente apreciados.

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