Azeite extravirgem pode ganhar o mundo em 10 anos, diz especialista
O Brasil pode, em cerca de 10 anos, considerar a perspectiva de exportar azeite de oliva extravirgem para outros países, como os Estados Unidos e o Canadá. O prazo seria equivalente ao momento em que todas as oliveiras plantadas até agora estejam adultas e em plena produção. Mas para isso, será importante estabelecer regulamentos segundo parâmetros da União Europeia, visando, inclusive, ingressar também nesses mercados.
“Será necessário criar regulamentos e estatutos que denominem com clareza a origem dos frutos dos varietais usados no Brasil. O traçado do DNA é muito importante, até mesmo para superar barreiras alfandegárias. O Brasil também precisaria se inserir nas linhas disciplinares do Conselho Olivícola Internacional”, sugere Marco Orecchia, agrônomo, jornalista e editor do Guia Flos Olei, considerado a mais importante publicação do mundo sobre azeites extravirgens. A revista seleciona 500 rótulos anuais por sua excelência.
O europeu está em um roteiro pelo estado, com direito a uma escapada até o Uruguai, visitando propriedades produtoras para conhecer de perto a atividade e levar dicas e orientações às empresas, de olho no futuro.
Com sete entre as nove propriedades brasileiras contempladas na edição 2023 do Flos Olei, o Rio Grande do sul entrou firme no roteiro da publicação. O tour do italiano percorre 10 propriedades gaúchas de destaque no setor para conhecer in loco o resultado dos pomares. A viagem se encerra no dia 16.
O europeu decidiu vir ao Brasil a convite do Instituto Brasileiro da Oliva (Ibraoliva). A entidade vislumbrou uma oportunidade de amplificar a participação do produto nacional, 80% oriundo de olivais do Rio Grande do Sul, no mercado global.
Responsável pelas páginas do Guia Flos Olei que tratam da produção brasileira de azeite de oliva extravirgem, a jornalista ítalo-brasileira Lisomar Silva, que acompanha Orecchia na viagem, explica que os olivais nacionais são acompanhados pela publicação desde 2009, quando surgiram as primeiras notícias sobre o desenvolvimento da atividade, na região da Mantiqueira, entre São Paulo e Minas Gerais. Em 2012, quando o Rio Grande do Sul começou a surgir no mercado de azeites extravirgens, o guia já começou a monitorar o trabalho.
Neste domingo, durante a visita à Fazenda Serra dos Tapes, em Canguçu, para onde retorna nesta segunda-feira, Orecchia fez uma pausa e ao Jornal do Comércio sobre suas impressões do que viu nesses primeiros dias no Brasil. Afirmou que o potencial da oleicultura brasileira e gaúcha é “apreciável“ e que as empresas produtoras contribuem muito para um colocar o azeite nacional em um patamar de confiabilidade.
Sobre perspectiva de mercado, o italiano sugeriu a adoção de medidas e ações conjuntas de produtores, com colaboração de entidades doa setores público e privado em que a sinergia possa favorecer a consolidação de uma imagem de produto nacional brasileiro. Em uma crítica construtiva, ele diz ter percebido uma “atitude dispersiva e competição interna”, quando o ideal seria um trabalho em equipe, com formação de redes de sinergia e energia para fortalecer imagem do produto nacional.
“Seria importante trabalhar com instituições que possam incentivar o consumo interno e criar imagens com campanhas promocionais e institucionais com produtores indicando o azeite como produto que faz bem à saúde e promover uma cultura gastronômica, de pratos delicados e saborosos”.
Antes de conhecer a Serra dos Tapes, Orecchia esteve em Caçapava do Sul, no olival da Prosperato, que desde 2017 tem lugar cativo no Guia entre as melhores marcas de azeite do mundo. Ele visitou o pomar e o lagar e conversou com o diretor, Rafael Marchetti.
“É preciso conversar com produtores de todos os países, pois cada um tem suas dificuldades. Talvez a questão ambiental seja a mais relevante no Brasil agora. A Europa, nos últimos cinco ou 10 anos, deu um grande salto tecnológico. Os equipamentos têm mudado muitíssimo nos últimos cinco anos, inclusive com maior controle térmico para as olivas, por exemplo”, observou o italiano.
Marchetti considerou o encontro valioso, já que seu interlocutor tem grande capacidade técnica, alta percepção sensorial, conhecimento a capo e de mercado.
“Ele nos falou sobre novas tecnologias em uso na Europa nos últimos 10 anos, como a agricultura 4.0 para a olivicultura, novas variedades e tendências de mercado. Conversamos também sobre irrigação, uma necessidade comum entre nós e os produtores europeus. Temos muita dificuldade na região, mas estamos estudando desde o ano passado uma forma de implantar algum sistema de retenção da água das chuças de inverno para usar nos pomares no verão”, disse o empresário.
O roteiro do editor do Flos Olei começou na Estâncias das Oliveiras, em Viamão. No dia 9, Orecchia acompanhou a abertura oficial da colheita, na sede da Biome Pampa, em Encruzilhada do Sul, e conheceu a empresa. Na manhã seguinte, a visita técnica foi nas instalações da Azeite Sabiá, de Encruzilhada do Sul, seguindo para as Olivas da Lua, no mesmo município. No sábado, os olivais conhecidos foram o Lagar H, em Cachoeira do Sul, e a Vila do Segredo, em Caçapava do Sul.
Além de avaliar a qualidade da oferta, o agrônomo e jornalista europeu tem alertado as propriedades visitadas sobre a importância de considerar a introdução de oliveiras de diferentes tipologias nos pomares para uma produção ainda melhor e maior.
“As altas temperaturas dos últimos anos nesta região durante as safras podem estar determinando uma nova forma padrão do sistema e dos eventos climáticos, incidindo sobre a atividade agrícola. Embora as oliveiras lidem bem com a restrição hídrica, ainda assim precisam de alguma água”, observa Orecchia.
É que plantas mais resilientes podem representar alternativas econômicas importantes. São necessários investimentos robustos nessa cultura, e os resultados não são imediatos, um complicador a mais para um produto que precisa ser consumido em até um ano para entregar todo seu vigor.
O manejo do solo também entrou na pauta das visitas do italiano. Equilibrar o fósforo com potássio, cálcio, ferro e outros elementos é fundamental para potencializar o fruto, ressalta.
Nesta segunda-feira, as atividades serão novamente na Serra dos Tapes e também nos Azeites Batalha, em Pinheiro Machado. Orecchia ainda pretende espichar a viagem até um olival da uruguaia Santa Laura, em Melo, na terça-feira. Na quarta, o roteiro volta ao Rio Grande do Sul, nos pomares da Capela de Santana, em Sentinela do Sul. A programação do último dia antes do retorno a Roma ainda não está definida.
Fonte: Jornal do Comércio