Quanto você consegue suportar?
Por: Fábio Verardi
Em 1976, o ator e cineasta ítalo-americano Sylvester Stallone nos apresentava seu personagem mais famoso, Rocky Balboa, um lutador mal sucedido que vivia vagante pelas ruas da Filadélfia até um dia tirar a sorte grande ao ser convidado para uma luta com o então campeão mundial de boxe. Rocky lutou bravamente, apanhou bastante, perdeu a luta, mas não sucumbiu perante seu adversário, tornando-se assim um ídolo no seu gueto por ter suportado tamanho desafio. Em 2010, Stallone seguiu com a saga do lutador no filme em que aplicou uma lição de moral ao filho ao ser questionado sobre voltar a lutar depois de velho, e, novamente nos ensinou que “não é o quanto você bate e sim o quanto você aguenta apanhar e seguir lutando”.
Somos diariamente convidados para entrar no ringue da vida, nossas conquistas são diretamente proporcionais à nossa dedicação, por isso, nada é injusto, porém, atualmente estamos sendo bombardeados com a ideia de que não podemos nos conformar com a vida que levamos e que precisamos ser mais. A otimização do tempo e o alcance global das ideias são a nova mina de ouro que todos buscam nesta década, não basta vender para seu bairro ou cidade, o objetivo agora é o mundo ou muito mais. Roberto Carlos queria ter um milhão de amigos e bem mais forte poder cantar, conseguiu mais de duzentos milhões, justamente por que esta é a luz de sua conquista, é o fardo que ele consegue carregar e seguir brilhando. Já Clara Nunes, em sua inesquecível voz, clamava no samba – “Eu imploro a Deus resignação para sufocar a chama que dilacera o meu coração” – ela certamente estava atormentada e buscava contentar-se, queria valorizar o que já havia conquistado ao invés de querer sempre mais.
Resignação, um sentido tão verdadeiro para a vida, mas que infelizmente passou a ser uma palavra que representa comodismo e covardia. Na verdade, o mundo quer que testemos nossa máquina ao limite, temos que empreender e gerar conteúdo para assim combater a mais nova pérola dos rótulos modernos – as crenças limitantes – pois, afinal, quem disse que você não pode ser aquilo que quiser? Ou que existem limites para se chegar ao topo do mundo? Essas mensagens motivacionais vendidas como tylenol esquecem de informar ao usuário que a cada dosagem ele terá também que suportar os efeitos colaterais de suas escolhas. A cada soco tomado, Rocky sentia instantaneamente o preço de sua luta e seu corpo pagava com a justa dor de querer mais para ser o campeão. Acontece que, no fundo, Rocky Balboa não queria ser um campeão, ele apenas queria fazer aquilo que precisava ser feito, ou seja, aquilo que ele sabia fazer – lutar. Não importavam os socos, o sangue ou a dor, pois ele sabia que tudo aquilo fazia parte do seu propósito, sem nenhuma surpresa ou enganação, ele lutava sendo o que ele era, e não esperava nada diferente daquilo.
Quando o malabarista na sinaleira faz seu show com quatro bolas no ar, nós o admiramos, mas, no fundo, nosso cérebro espera o momento em que ele cometerá o erro de derrubar tudo ao chão. Isso nos faz entender que acreditamos e sabemos que para tudo existe um limite, e, que ele é diferente para cada tipo de pessoa. Por isso, antes de entrar no ringue é preciso ter a real noção de quem somos, quem foram nossos pais, como nos comportamos perante as dificuldades da vida, para assim saber o quanto conseguiremos suportar. Afinal, a grande descoberta é saber que tipo de pessoa você é, de verdade, sem filtros ou encorajamentos que não durem até a noite de domingo, para assim ter a certeza de quanto você consegue suportar.