Uma fazenda modelo de sustentabilidade e diversidade

Uma das mais tradicionais propriedades rurais do Rio Grande do Sul também é hoje uma referência em sustentabilidade e diversificação de negócios. Fundada em 1945 por Walter Germano Pötter com foco na produção de arroz, em Dom Pedrito, a Estância Guatambu avançou aos poucos para lavouras de soja, milho e forrageiras (incluindo sementes), pecuária – especialmente com bovinos Hereford e Braford e alta genética -, além da ovinocultura, com a raça Texel.

Hoje, abarca ainda atividades industriais e do setor de serviços, com o cultivo de uvas para produção de vinho e com o enoturismo. E, em breve, uma nova fonte de receita começará a tomar corpo na propriedade: a energia solar.

A propriedade de 10,8 mil hectares no Sul do Estado tem cerca de 50 funcionários e gestão familiar, organizada sob um conceito de sustentabilidade que agrupa gestão, ambiente e sociedade, explica Valter José Pötter, proprietário e diretor-geral da Guatambu.

A ideia básica da fazenda é ampliar os negócios em todas as esferas da cadeia produtiva, olhando para o que a propriedade pode ter e dentro das características e possibilidade da região. Pötter gerencia as muitas atividades que giram no entorno da Guatambu com a esposa Nara (na área de eventos e conselheira-geral) e as filhas Gabriela (agrônoma, responsável técnica da vinícola) e Mariana (psicóloga e diretora administrava).

“Os muitos anos no campo foram nos alertando para o que é mais importante, que devemos preservar o ambiente e encontrar as melhores formas para trabalhar”, sintetiza Pötter, formado em Medicina Veterinária.

O modelo de gestão adotado pela família chama a atenção desde universitários a profissionais de diferentes áreas e empresas que visitam a Guatambu. Para quem costuma perguntar a essência do sucesso para o trabalho no campo, Pötter resume da seguinte forma: infraestrutura, investimentos mínimos necessários e bons gerenciamentos dos recursos de produção.

“Tecnologia tem aos montes e existem diversas formas de produzir, mas o diferencial é ver o que se encaixa na região, no ambiente onde se está, do domínio da tecnologia e das técnicas adotadas, ver o que o clima permite. Esse bom gerenciamento dos recursos de produção, tecnológicos, econômicos e gerenciais, eu digo que são a chave principal do negócio”, alerta o produtor.

Pötter completa as lições de gestão lembrando que o que faz a diferença é a cabeça da pessoa que está tomando as decisões e a sintonia com os funcionários, para que as ideias avancem. Para que a inovação no campo seja uma constante, diz, é preciso estar sempre buscando alternativas para produzir mais, melhor e com menos custos. Como? Com qualificação.

“Como se forma uma equipe campeã, que ganha medalha de ouro? Com treinamento constante. Rotinas, padrão operacional, índices de controles, planos de melhorias, indicadores etc., são ferramentas de controle de qualidade que a ‘área urbana’, digamos assim, usa há muito tempo e área rural despertou depois, mas vem utilizando”, detalha Pötter.

Uma fazenda, muitas atividades

Veja porque a Guatambu é considerada uma fazenda modelo em sustentabilidade e diversificação de atividades rurais. A sede da vinícola é o que melhor ilustra esse conjunto de diferenciais, da cobertura do prédio à construção e seu entorno. As paredes são de argila injetada (para evitar o uso de rochas), aberturas reforçadas para receber luz solar e máxima luminosidade natural interna, por exemplo. A prioridade foi contar na construção com material reciclado, como tijolos e madeira. Calhas fazem a coleta de água da chuva e o jardim é exclusivo com plantas e árvores nativas da região. E, no entorno, 600 placas solares fazendo a captação de energia, sobre os estacionamentos cobertos, completam o cenário.

Serviços entram na diversificação

Por todos os diferencias de gestão, diversificação e sustentabilidade, a Guatambu é procurando com frequência para vistas e palestras técnicas e Dias de Campo. Com o aumento dos pedidos, atividade passou a ser feita de formas profissional, por meio de um escritório que organiza os pedidos sobre o tema (de pecuária de corte a energias renováveis). “Isso já faz parte de uma receita bem interessante do negócio”, assegura Pötter.

Pesquisas científicas

Em parceria com diferentes entidades e universidades, a Guatambu é investe na pesquisa científica como forma de aprimoramento. Os estudos feitos ali, diz Valer Pötter, já atraíram até mesmo a emissora inglesa BBC, que esteve na propriedade filmando sobre um estudo de doutorado da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) sobre controle de um inço que avança e causa danos na região, o Capim Anoni, cujos resultados foram posteriormente divulgado na Europa.

Com a Embrapa, mantém convênio em um avançado trabalho de genética animal que permite saber, antes mesmo de um bovino nascer, a quais doenças será mais resistente ou que características terá destacadas. “É um trabalho muito avançado e permite que, ao colocarmos um animal para venda, já tenhamos informações muito completas sobre ele para repassar ao comprador”, orgulha-se Pötter.

No caso dos ovinos criados em meio aos vinhedos, que é uma área fértil em termos de manejo e adubação orgânica, outro estudo ganhou projeção pelas mãos da Universidade Federal de Pelotas (UFPEL). Uma pesquisa da Faculdade de Veterinária constatou que o bagaço da uva e sementes usados na alimentação, em cerca de 30% da dieta dos ovinos, se pode reduzir em até 30% a emissão de metano no ambiente.

Água da chuva

Quase no cento da propriedade há uma barragem que serve para irrigação via pivôs e para a área de várzea onde é semeado arroz. O “lago artificial” tem 160 hectares e 5 milhões de metros cúbicos de água. Da mesma forma, a água que cai sobre o telhado da sede (rodeada de calhas) é colhida,armazenada e tratada. “Não usamos água urbana”, destaca Pötter.

Ações sociais

A Guatambu destina, na parte social, 2% da renda líquida para entidades carentes, hospitais e entidades de combate ao câncer, por exemplo. Filhos de pais de baixa renda da região, que integram o chamado Pelotão Mirim, também contam com apoio como equipamentos e reforma de computadores.

Bioma Pampa

Foto: GUATAMBU/DIVULGAÇÃO/JC

Na Estância Leões, onde estão os parreirais, por exemplo, está uma área reserva onde são encontrados pássaros ameaçados em extinção, como o Veste Amarela. A região conta com campo natural e tem bioma pampa representando por cerca de três mil espécies de plantas, mais de 400 árvores e aproximadamente 80 mamíferos. De acordo com Valter Pötter, a família foi a primeira a averbar 20% de suas áreas para reserva legal, há mais de 20 anos.

Menos químicos nas parreiras

Nos vinhedos, dentro da ótica da sustentabilidade, a vinícola adotou uma máquina que reduz a necessidade de tratamentos fitossanitários. O equipamento, importado do Chile, passa pelo parreiral, a 5 km por hora, emitindo um jato de ar quente a 125 graus celsius, que esteriliza o ambiente de alguns fungos.

“Com tudo isso, reduzimos o uso de produtos químicos nas uvas. O equipamento chileno foi desenvolvido para amenizar a geada nos parreirais, mas acabou se descobrindo depois que esse choque térmico faz com que a planta acione um metabolismo que faz engrossar a casca o que faz aumentar sua proteção natural”, explica Gabriela Pötter, responsável técnica pela vinícola.

Também são usadas alternativas orgânicas para combater os principais inimigos naturais dos fungos que podem atingir as parreiras.

Energia solar

Foto: ALEXANDRE TEIXEIRA/DIVULGAÇÃO/JC

Fruto de investimento de R$ 1,5 milhão feito há três anos, as 600 placas de captação solar tornaram a Guatambu – Estância do Vinho autossuficiente energeticamente. Em breve, deve virar fonte de receita. Hoje, explica Valter Pötter, a vinícola arca só com a chamada demanda contratada da rede elétrica (entre R$ 1,2 mil e cerca de R$ 2,3 mil). Antes, havia um custo de mais de R$ 20 mil mensais. “ Vamos expandir a capacidade do parque solar em 50%. A próxima etapa será comercializar energia”, diz Pötter. Ter geração própria sempre esteve junto com o projeto da vinícola. “Desde o início havia a ideia fixa de ter energia renovável. Uma vinícola consome tanta energia quanto um frigorífico.”

Turismo

Foto: ESTÂNCIA GUATAMBU/DIVULGAÇÃO/JC

O enoturismo é uma fonte de receita extra e crescente. Passam pela vinícola em torno de 6 mil pessoas por ano, sem convênio com agências de turismo ou outras parcerias e mídia paga. O público é atraído por curso de degustação de vinhos e almoços harmonizados, uma vez por mês, com a presença dos donos. Além dos eventos para empresas.

Vinícola

Uma das maiores fontes de renda da Guatambu começou em apenas meio hectare, para testes de uma cepa de uva escolhida por Gabriela Pötter para dar início ao trabalho, em 2012. Além da qualidade dos vinhos e espumantes, muitos deles já premiados, um grande diferencial é a sustentabilidade da produção, assegura Pötter. “Muitos optam pelos nossos vinhos e não por outros de qualidade semelhantes, mas mais baratos, pela sustentabilidade que adotamos aqui”, diz o produtor.

Hoje, os vinhedos ocupam 20 hectares. São produzidas 120 mil garrafas/ano. “Tenho mercado para 150 mil a 200 mil garrafas e, hoje, não temos nem como atender novos clientes”, destaca Pötter.

Fonte: Jornal do Comércio

Foto: RODRIGO ALVES VIEIRA/DIVULGAÇÃO/JC

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